É impossível Pensar o Universo Sem A Matemática?

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Creio que hoje em dia é impossível pensar o universo com as ferramentas científicas que temos sem a matemática. Veja bem, não estou dizendo que a matemática é “a forma com que Deus criou o Universo”, pois caso fosse não existiriam tantos paradoxos. O meu ponto é que hoje nossa tecnologia/ciência e, portanto, nossa forma de nos relacionarmos com o universo está tão dependente da matemática que pensar o universo sem ela está além do nosso alcance.

Quando escolhemos um viés cartesiano para estruturar nosso pensamento científico fizemos uma opção de seguir a estrutura do pensamento grego, onde o rigor argumentativo e as provas sofisticadas sobrepujaram o empirismo e a experiência pessoal. Intuir já não mais bastava.

Ao absorvermos o método científico de Francis Bacon como modelo de estudo escolhemos abandonar uma série de correntes filosóficas que tinham sua própria visão do Universo, como o Hermetismo, que de forma interessante e sem a “prova matemática” já antecipava uma das Leis de Newton e o princípio da Teoria das Cordas, e justamente por isso não se encaixava nesta nova estrutura científica.

+ LEIA MAIS: Quais são as sete leis do Hermetismo que regem o universo?

Tudo bem que Francis Bacon era uma figura controversa e não acumulou tantos méritos assim para ser chamado de pai da ciência moderna, apesar de que eu ainda discuto se, de fato, entendemos a revolução que ele queria promover. No artigo “Francis Bacon: O Primeiro dos Modernos e o Último dos Antigos” desenvolvo rapidamente esta discussão.

Mas a verdade é que o rigor matemático acabou vencendo a queda de braço e hoje você só pode ler este texto pois existe um dispositivo que interpreta uma sequência de “zeros” e “uns” e os transforma em um ambiente gráfico que simula um papel impresso. O que me faz pensar que Galileu Galilei não soa mais tão exagerado quando disse que “a filosofia está escrita neste grande livro, o universo… [Mas o livro] está escrito na linguagem da matemática”.

Quando o Homem Começou a Pensar o Universo usando Matemática?

Historicamente não sabemos quando começamos a aplicar a matemática ao mundo e eu suspeito que a matemática já era parte da nossa vida antes mesmo de tomarmos consciência dela. Sua aplicação prática na solução de problemas da vida humana tem os primeiros registros entre os babilônios, que a usava para descobrir os padrões dos eclipses, quase três mil anos atrás.

A matemática do Antigo Egito, por exemplo, apesar de primitiva era altamente aplicável e fincou as raízes do método científico. Seu desenvolvimento se deu de acordo com a necessidade, contemplando apenas  situações práticas e casos particulares, sem a preocupação de demonstrações ou o desenvolvimento de um escopo teórico generalizado, algo que só viria com os gregos.

Mesmo com pouca teoria e apenas uma operação elementar os egípcios conseguiram resultados impressionantes, alguns dotados de alta complexidade se considerarmos que estamos falando matemáticos primitivos que só conheciam a adição e algumas frações específicas.

Todavia, algumas evidências nos dizem que esse relacionamento com a matemática pode ter acontecido bem antes. No livro “História da Matemática”, Carl Boyer afirma existir evidências de que a ideia de número, por exemplo, é muito mais velha do que se admitia. “Essa percepção de uma propriedade abstrata que certos grupos têm em comum e que nós chamamos ‘número’ representa um grande passo no caminho para a matemática moderna. É improvável que isso tenha sido descoberta de um homem só ou de uma dada tribo; é mais provável que a percepção tenha sido gradual, desenvolvida tão cedo no desenvolvimento cultural do homem quanto o uso do fogo, talvez à trezentos mil anos,” ele escreve.

Na história podemos perceber que junto com a linguagem viria o desenvolvimento da matemática abstrata, mas foram necessários mais de dois milênios após os babilônios e os egípcios para que a invenção do cálculo e da física newtoniana nos desse a capacidade de explicar padrões complexos do nosso universo.

Qual a Importância de Descrever o Universo Usando Matemática?

A matemática pura e a aplicada sempre impulsionaram juntas o desenvolvimento do nosso entendimento do universo e quando dominamos o cálculo começamos a dialogar com as leis universais e não mais apenas observá-las. Será que um dia a matemática nos permitirá prevê-las ou até mesmo controlá-las? As Equações de Navier-Stokes estão aí pra nos dizer que isso não é algo tão difícil e mágico o quanto pensamos.

Costuma-se dizer que a solução geral das equações de Navier-Stokes com turbulências é o “último problema não resolvido da física-matemática clássica” e atualmente é um dos problemas matemáticos do século XXI. Elas vão permitir, assim que solucionadas, determinar o comportamento de qualquer fluído e ajudar a evitar acidentes diversos, bem como permitir inovações tenológicas no setor do transporte aeroespacial.

Este é só um exemplo de como a matemática e sua evolução impactam na nossa relação com o universo. Basicamente, desde o advento do cálculo diferencial todas as grandes descobertas científicas usaram a matemática de alguma forma, o que faz dela a linguagem mais poderosa que a raça humana desenvolveu até o momento (poderão existir outras melhores, e aposto fortemente nisso, mas ainda não as encontramos).

Mesmo assim, eu ainda tendo a acreditar que se a matemática é a linguagem com que o universo foi criado, então, neste estágio em que estamos, somos crianças em alfabetização dominando um vocabulário rudimentar e extremamente curto. Caso contrário nossa matemática não geraria tantos paradoxos quando usada para descrever o universo.

Tomar consciência do fato de que ainda somos neófitos na iniciação da matemática não é um problema. Coloque-se no lugar de Arquimedes de Siracusa, o grande gênio de sua geração, impossibilitado de ampliar seu Princípio da Exaustão para o que hoje chamamos de Integral de Riemann, pois séculos o separava da noção de limite que só viria com o Cálculo Diferencial.  Agora tente projetar o que ainda poderemos desenvolver no futuro partindo do ponto onde estamos matematicamente falando. Imagine o que poderemos fazer quando dominarmos a matemática como um adulto que domina a sintaxe desta linguagem universal.

Existe uma infinitude de possibilidades que serão escolhidas pela nossa própria necessidade de entender o universo, ele nos dirá o que ainda não sabemos e precisamos entender. Longe de ser um problema, isto só significa que ainda não dominamos a matemática de modo satisfatório, não contradizendo a hipótese Sapir-Whorf, que afirma que você não pode discutir um conceito a menos que tenha a linguagem para descrevê-lo.

Por isso que para estudar, compreender e melhor viver neste universo, principalmente quando falamos de áreas da ciência como a física, onde a abstração é parte do jogo, é essencial descrever conceitos que não se adaptam bem à linguagem humana. Um elétron, por exemplo, é descrito pela equação que modela o seu comportamento, deduzida por Paul Dirac em 1928. E nesta equação você empacota todas as informações essenciais sobre um elétron.

A cada vez que fazemos isso, a humanidade cria uma relação de equivalência entre algo do nosso universo e um objeto no universo da matemática. Intuitivamente você pode pensar como um jogo de ligar os pontos: de um a lado o universo onde vivemos e de outro o universo da matemática. Ao ligarmos os pontos conseguimos traduzir os problemas do mundo real para o mundo da matemática e ao resolve-los ali teremos resolvido na realidade também.

Claro que quanto mais sofisticado o fenômeno que queremos estudar mais complexo será o nosso problema matemático e por isso é tão importante explorar novas teorias e ramos da matemática. “Usando uma nova teoria matemática de Riemann, Albert Einstein promoveu um avanço extraordinário sobre a natureza do Universo: o tempo, ele descobriu, era a quarta dimensão. A nova geometria de Riemann permitiu unificar espaço e tempo,” exemplificou Marcus du Sautoy em um artigo para a BBC.

Além de tudo isso, é quando olhamos para as nossas ações cotidianas que percebemos como estamos intrinsecamente ligados à matemática. Como bem argumentou Peter Watson, professor emérito da Universidade de Carleton: “A decisão de ultrapassar um carro lento não envolve a integração explícita das equações do movimento, mas certamente o fazemos de forma implícita. Um Tesla no piloto automático realmente os resolverá explicitamente”.

A Matemática Modela Até Mesmo as Imprevisibilidades do Universo

Isaac Newton mudou a ciência no século XVIII ao traduzir fenômenos naturais em linguagem matemática, sendo pioneiro na exploração das possibilidades preditivas destes fenômenos, além de nos mostrar que poderíamos explorar o comportamento de todos os fenômenos se tivéssemos informações suficientes.

Entretanto, um fato que matemáticos e físicos já se resignaram é que descrever um fenômeno matematicamente não permite, na maioria dos casos, controlá-lo, muito menos prevê-lo. Mas para contornar esta imprevisibilidade do universo, onde os fenômenos nem sempre estão em equilíbrio, o século XX descobriu os “sistemas caóticos”, ou a Teoria do Caos.

“Como se o bater das asas de uma borboleta na Ásia, provocasse, meses depois, um tornado na América” é a síntese do que conhecemos como Efeito Borboleta. Essa citação de Edward Lorenz feita em 1961 talvez seja tão conhecida quanto incompreendida, mas ela resume bem a teoria do caos.


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Quando Lorenz proferiu esta ideia, seu objetivo era elucidar interpretações técnicas por meio de uma alegoria didática. Por definição pouco rigorosa, um sistema caótico seria aquele que sofre alterações drásticas em seu resultado quando são feitas mínimas alterações em suas condições iniciais. Grosso modo, a Teoria do Caos estuda o comportamento de sistemas dinâmicos não-lineares (traduzindo: várias equações diferenciais complicadas que devem ser solucionadas simultaneamente) que são altamente sensíveis a perturbações em suas condições iniciais.

Neste momento, lembre-se de quantas vezes você viu uma previsão do tempo errada para a semana seguinte quando preparou sua viagem à praia? Isso é porque este é um sistema caótico e as equações que descrevem o clima são intrinsecamente caóticas, então podemos fazer previsões precisas no curto prazo (cerca de 24 horas), mas elas se tornam cada vez mais incertas ao longo dos dias. Dificilmente a previsão do tempo que aparece agora no seu celular vai errar o clima de amanhã, mas não aposte hoje na previsão para daqui a cinco dias.

Peter Watson, professor emérito da Universidade de Carleton, dá outro bom exemplo desta situação: “da mesma forma, a mecânica quântica fornece uma teoria em que sabemos exatamente quais previsões não podem ser feitas com precisão. Pode-se calcular as propriedades de um elétron com muita precisão, mas não podemos prever o que um indivíduo cheio deles fará”.

A Matemática é ótima para projeções de sistemas sociais.

A Teoria dos Jogos quebrou a última barreira entre a matemática e as ciências humanas. Este é um ramo da Matemática Aplicada inciado por John von Neumann e John Nash que estuda situações em que duas ou mais partes se confrontam, no sentido de maximizarem seus ganhos.

Inicialmente ligada a questões econômicas e de energia nuclear, a Teoria dos Jogos é agora usada em áreas do conhecimento alheias à matemática. Por causa de jogos como o Dilema do Prisioneiro, a Teoria dos jogos tem despertado também o interesse da Filosofia, Ética e Ciência Política. Em geral, a Teoria de Jogos pode ser usada quer para prever o resultado de uma situação de confronto, quer para aconselhar um dos confrontantes a tomar a melhor decisão.

Com isso a Teoria dos Jogos veio preencher a necessidade de uma boa teoria de matemática preditiva, que rege desde fenômenos sociais e revoluções aos mercados de ações. Mesmo sem a condição de prever, podemos descrever e criar modelos que podem ser aplicados em análises futuras.

Além disso, vivemos num mundo regido pela Estatística, cujas ferramentas são usadas tanto para as avaliações no trabalho, quanto para previsões do comportamento de serial killers. Segundo Peter Watson: “O amor pode ser cego, mas os relacionamentos são certamente previsíveis. A grande maioria de nós escolhe parceiros dentro de nossa classe social e grupo linguístico, então não há dúvida de que isso é verdade no sentido estatístico. Mas também é verdade no sentido local. Uma série de sites de namoro ganham dinheiro com algoritmos que pelo menos fazem alguma pretensão de combiná-lo com seu parceiro ideal.”

Em suma, a matemática esta em todos os campos da sua vida, no peso que você coloca para as repetições dos exercícios que faz na academia, no cálculo de tempo que você faz pra saber se é possível assistir mais um episódio da sua série favorita e até mesmo ritmo de batimentos cardíacos enquanto você dorme. Portanto, perguntar pra que serve a matemática é sem sentido e só mostra o quanto ainda você não tem ideia nem daquilo que não sabe.

Leia Mais:

Referências Bibliográficas:

  1. Carl B. Boyer – “História da Matemática” – Link do livro
  2. Ilya Prigogine – “As Leis do Caos” – Link do livro
  3. Harriet Swain – “Grandes questões da ciência” – Link do livro
  4. Rubem Alves – “Filosofia da Ciência” – Link do livro
  5. Galileu Galilei – “Diálogo sobre os dois máximos sistemas do mundo ptolomaico e copernicano” Link do livro

1 comentário em “É impossível Pensar o Universo Sem A Matemática?”

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