Variáveis Complexas | Diferenciabilidade e Funções Analíticas

Uma função f definida em S é uma regra que associa cada z do conjunto S a um número complexo w, denominado valor de f em z.

Desta forma, escrevemos $$f(z) = w,$$ onde z é denominada variável complexa, o conjunto S é o domínio da função f.

Neste contexto, queremos, nesse artigo, estabelecer conceitos de diferenciabilidade inerente ao cálculo, agora, para funções complexas.

Por consequência, desenvolveremos as Equações de Cauchy-Riemann e definiremos o que são funções analíticas complexas.

Diferenciabilidade de Funções Complexas

A derivada de uma função complexa f(z) no ponto z_0 é dada pelo limite $$f'(z_0)=\lim_{z \rightarrow z_0}{\frac{f(z) – f(z_0)}{z-z_0}}$$ se este limite existe, e neste caso, dizemos que f é diferenciável no ponto z_0.

OBSERVAÇÃO:

1. Se fizermos z-z_0 = \Delta z então podemos definir $$f'(z)=\lim_{\Delta z \rightarrow 0}{\frac{f(z+\Delta z) – f(z)}{\Delta z}}.$$

2. As regras de derivação para funções complexas são as mesmas aplicadas para funções de variáveis reais estudadas no cálculo diferencial. Ou seja, dadas duas funções de variável complexa f e g, temos que

  1. (cf)'(z) = c(f'(z))
  2. (f+g)' (z) = f'(z) + g'(z)
  3. (fg)'(z) = f'(z).g(z) + f(z)g'(z)
  4. \left( \frac{f}{g} \right)'(z) = \frac{g(z)f'(z) - f(z)g'(z)}{g(z)^2}
  5. \left( z^n \right) = n z^{n-1}

3. Para a composição de funções complexas f e g, dada por (f\circ g)(z) = f(g(z)), vale a regra da cadeia $$(f(g(z)))’ = f'(g(z))g'(z).$$

EXEMPLO

A função f(z) = \bar{z} não é diferenciável. De fato, f(z) = \bar{z} = x-yi se z=x+iy. Desta forma, $$f'(z)=\lim_{\Delta z \rightarrow 0}{\frac{\bar{(z+\Delta z)} – \bar{z}}{\Delta z}}$$ cujo limite não existe. Portanto, \bar{x} não é diferenciável.

EXEMPLO [A Função |z|]

A função real f(x) = |x| não é derivável para x=0. Vamos verificar a derivabilidade da função f(z) = |z|.

Temos que $$f'(z)=\lim_{ z \rightarrow 0}{\frac{|z| - |0|}{z - 0}} = \lim_{ z \rightarrow 0}{\frac{|z|}{z}}$$ que não existe. Portanto, a função modular complexa não é diferenciável no ponto z=0.

Por outro lado, assim como a função real f(x)=(|x|)^2 é derivável no ponto x=0, a função complexa f(z) = |z|^2 é diferenciável no ponto z=0. De fato,

$$f'(z)=\lim_{ z \rightarrow 0}{\frac{|z|^2 - |0|^2}{z - 0}} = \lim_{ z \rightarrow 0}{\frac{z.\bar{z}}{z}} = \lim_{ z \rightarrow 0}{\bar{z}} = 0$$

EXEMPLO Encontre a derivada de f(z) = \frac{z^2 - 9}{z^2+1}

Pela regra do quociente,

$$f'(z) = \frac{(z^2 +1)(2z) - (z^2 - 9)2z}{(z^2+1)^2} = \frac{20 z}{(z^2+1)^2}$$

Funções Analíticas

Uma função f(z) é dita analítica em um ponto z=z_0, se é definida e diferenciável em um disco aberto com centro em z_0.

Dizemos ainda, que f(z) é analítica em um domínio D se esta função é analítica em cada ponto do conjunto D.

Muitas vezes, uma função analítica é também expressa como função holomorfa ou função regular.

EXEMPLO

A função f(z) = z^2 é analítica, pois para cada z_0 do plano complexo, podemos definir um disco D_{r}(z_0), tal que f'(z) = 2z, \forall z \in D_{r}(z_0).

EXEMPLO A função f(z) = |z|^2 não é analítica em nenhum ponto do plano. Note que, para z\neq 0

$$f'(z) = \lim{\Delta z \rightarrow 0}{\frac{f(\Delta z + z) - f(z)}{\Delta z}} = \lim{\Delta z \rightarrow 0}{\frac{|\Delta z + z|^2 - |z|^2}{\Delta z}} =$$
$$ = \lim{\Delta z \rightarrow 0}{\frac{(\Delta z + z)(\bar{\Delta z} + \bar{z}) - \bar{z}}{\Delta z}} =\lim{\Delta z \rightarrow 0}{\frac{\Delta \bar{z} + \bar{\Delta z} z + \Delta z \bar{\Delta z}}{\Delta z}}=$$ $$ = z+z\underbrace{ \lim_{\Delta z \rightarrow 0}{\frac{\bar{\Delta z}}{\Delta z}}}_{não\;\;\;existe!!!!},$$ portanto f não é derivável em nenhum ponto fora da origem. Logo, f não é analítica nem em z=0 pois, para qualquer disco centrado em 0, existirá um ponto interior ao disco para o qual a derivada de f não está definida.

EXEMPLOS [Funções polinomiais e racionais]

Qualquer função na forma $$f(z) = c_0 + c_1 z + c_2 z^2 + ... + c_n z^n,$$ onde c_i é uma constante complexa para cada i=1,...,n. O quociente de dois polinômios g(z) e h(z), dado pela função $$f(z) = \frac{g(z)}{h(z)}$$ é denominado função racional. Esta função é analítica para todo z \neq 0.

As Equações de Cauchy-Riemann

TEOREMA [As Equações de Cauchy-Riemann]

Seja f(z) = u(x,y) + i v(x,y) definidas e contínuas em algum disco aberto de um ponto z=x+iy e diferenciável em z. Então, f(z) é analítica neste ponto se, e somente se, u(x,y) e v(x,y) satisfazem as equações $$\frac{\partial u}{\partial x} = \frac{\partial v}{\partial y}\;\;\;e\;\;\;\frac{\partial u}{\partial y} = -\frac{\partial v}{\partial x}.$$ Esta equação são denominadas de equações de Cauchy-Riemann.

Vamos estabelecer uma relação entre a derivada de f(z) e as derivadas parciais das funções u(x,y) e v(x,y).

Seja f(z) uma função analítica. Desta forma, f é derivável e as derivadas parciais de u e v existem.

Por definição,
\begin{eqnarray*}
f'(z) & = & \lim_{\Delta z \rightarrow 0}{\frac{f(\Delta z + z) - f(z)}{\Delta z}}\\
& = & \lim_{(\Delta x, \Delta y) \rightarrow (0,0)}{\frac{f(\Delta x + i \Delta y + x+iy) - f(x+iy)}{\Delta x+i\Delta y}}\\
& = & \lim_{(\Delta x, \Delta y) \rightarrow (0,0)}{\frac{f((\Delta x+x) + i (\Delta y +y)) - f(x+iy)}{\Delta x+i\Delta y}}\\
& = & \lim_{(\Delta x, \Delta y) \rightarrow (0,0)}{\frac{u(\Delta x+x, \Delta y +y)+iv(\Delta x+x, \Delta y +y) - [u(x,y)+v(x,y)]}{\Delta x+i\Delta y}}\\
\end{eqnarray*}

Como f é analítica,

\begin{eqnarray*}
f'(z) & = & \lim_{(\Delta x, 0) \rightarrow (0,0)}{\frac{u(\Delta x+x, \Delta y +y)+iv(\Delta x+x, \Delta y +y) - [u(x+iy)+v(x+iy)]}{\Delta x+i\Delta y}}\\
& = & \lim_{\Delta x \rightarrow 0}{\frac{u(\Delta x+x, y)+iv(\Delta x+x, y) - [u(x,y)+v(x,y)]}{\Delta x}}\\
& = & \frac{\partial u}{\partial x} + i \frac{\partial v}{\partial x}\\
\end{eqnarray*}

Analogamente,

$$
f'(z) = \lim_{\Delta y \rightarrow 0}{\frac{u(x, \Delta y +y)+iv(x, \Delta y +y) - [u(x+iy)+v(x+iy)]}{i\Delta y}} = \\ = - i \frac{\partial u}{\partial y} + \frac{\partial v}{\partial y}
$$

Agora, se considerarmos z= r(\cos(\theta) + i \sin(\theta)) e fizermos f(z) = u(r,\theta) + i v(r, \theta). Pela regra da cadeia,

\begin{eqnarray*}
\frac{\partial u}{\partial r} & = & \frac{\partial u}{\partial x}\frac{\partial x}{\partial r}+ \frac{\partial u}{\partial y}\frac{\partial y}{\partial r} \\
& = & \frac{\partial u}{\partial x}\cos{\theta}+ \frac{\partial u}{\partial y}\sin{\theta} \\
\\
\\
\frac{\partial u}{\partial \theta} & = & \frac{\partial u}{\partial x}\frac{\partial x}{\partial \theta}+ \frac{\partial u}{\partial y}\frac{\partial y}{\partial \theta} \\
& = & \frac{\partial u}{\partial x}(-r\sin{\theta})+ \frac{\partial u}{\partial y}(r\cos{\theta}) \\
& = & r \left( -\frac{\partial u}{\partial x}\sin{\theta}+ \frac{\partial u}{\partial y}\cos{\theta} \right)\\
\\
\\
\frac{\partial v}{\partial r} & = & \frac{\partial v}{\partial x}\cos{\theta}+ \frac{\partial v}{\partial y}\sin{\theta} \\
\\
\\
\frac{\partial v}{\partial \theta} & = & r \left( - \frac{\partial v}{\partial x}\sin{\theta}+ \frac{\partial v}{\partial y}\cos{\theta} \right)\\
\end{eqnarray*}

então as equaçãos de Cauchy-Riemann se reduzem a $$\frac{\partial u}{\partial r} = \frac{1}{r} \frac{\partial v}{\partial \theta}\;\;\;e\;\;\;\frac{\partial v}{\partial r} = -\frac{1}{r}\frac{\partial u}{\partial \theta}.$$

Equação de Laplace

A equação de Laplace, é uma equação diferencial parcial de alta relevância, pois é descritora modelar de comportamentos em vários campos da ciência e a teoria geral de soluções para a equação de Laplace é conhecida como teoria do potencial.


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O maior importância do estudo de funções analíticas complexas para a engenharia é que as partes real e imaginária de uma função analítica satisfazem as equações de Laplace.

Este resultado é garantido pelo teorema abaixo.

TEOREMA [Equação de Laplace]

Se f(z) = u(x,y) + i v(x,y) é analítica em um conjunto D, então tanto u(x,y) quanto v(x,y) satisfazem as equações de Laplace $$\nabla ^2 u = \frac{\partial ^2 u}{\partial x^2} + \frac{\partial ^2 u}{\partial x^2} = 0$$ e $$\nabla ^2 v = \frac{\partial ^2 v}{\partial x^2} + \frac{\partial ^2 v}{\partial x^2} = 0$$ em D e possuem derivadas parciais de segunda ordem em D.

A notação \nabla ^2 é denominada laplaciano e toda função que satifaz as equações de Laplace são conhecidas como funções harmônicas.

Se a função u(x,y) satisfaz a equação $$\nabla ^2 u = \frac{\partial ^2 u}{\partial x^2} + \frac{\partial ^2 u}{\partial x^2} = 0$$ em uma região R do plano ela é denominada harmônica em R. o mesmo ocorrendo com uma função v(x,y).

O nosso problema agora consiste em responder a seguinte pergunta: Dada uma função harmônica u(x,y) numa região R, podemos determinar v(x,y) de modo que f(x+iy) = u(x,y)+v(x,y)i seja analítica? A resposta é sim, e o processo é descrito no exemplo abaixo.

EXEMPLO

Considere u(x,y) = x^2 - y^2.

Temos que $$ \nabla ^2 u = \frac{\partial ^2 u}{\partial x^2} + \frac{\partial ^2 u}{\partial x^2} = 2-2=0,$$ ou seja, u é harmônica.

Pelas equações de Cauchy-Riemann temos que $$\frac{\partial u}{\partial y} = -\frac{\partial v}{\partial x} \Rightarrow 2y = \frac{\partial v}{\partial x} \ \Rightarrow 2yx + g(y) = v(x,y).$$ $$\frac{\partial u}{\partial x} = \frac{\partial v}{\partial y} \Rightarrow 2x = 2x + g'(y) \Rightarrow g(y) = c.$$ Portanto, $$v(x,y) = 2xy + c.$$ Sendo assim, nossa função f(z) é dada por $$f(z) = (x^2 - y^2) + (2xy + c)i = (x^2 +2xyi - y^2) + ic = z^2+ic$$ que é uma funçao analítica.

Leia Mais:

Referências Bibliográficas:

  1. KREYSZIG, E. Advanced Engineering Mathematics, John Wiley & Song, Inc., 8th Edition, 1999.
  2. ÁVILA, Geraldo S. S. Variáveis Complexas e Aplicações. 3ª Edição. Rio de Janeiro: LTC, 2000.
  3. ZILL, Dennis G. "Curso Introdutório à Análise Complexa com Aplicações". 2ª edição, LTC, Rio de Janeiro, 2011

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